- Peri Dias
Reforma da Previdência: o que mudará nas finanças pessoais?
Faltam pelo menos alguns meses para a reforma da Previdência virar realidade, se é que vai virar. Há muitas dúvidas sobre se alguma modificação será aprovada pelo Congresso e, caso o projeto passe, sobre que modelo de reforma entrará em vigor.
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Ainda assim, a discussão sobre a mudança no sistema previdenciário parece ter engrenado no Congresso e na imprensa. Os principais veículos de notícias estão dedicando bastante espaço ao tema, e o governo já anunciou repetidamente que aprovar a reforma é sua prioridade para 2019.
Nesse clima, muitos trabalhadores começam a se preocupar com o impacto que a reforma pode provocar nos investimentos atuais e naqueles destinados a construir uma aposentadoria.
Para ajudar a esclarecer as possíveis transformações no cenário de investimentos de curto e de longo prazo, o Veduca entrevistou a consultora em investimentos Sandra Blanco, da Órama, empresa com sede no Rio de Janeiro especializada em orientações sobre aplicações financeiras para pessoas físicas.
Blanco tem mais de 20 anos de experiência no mercado financeiro e já trabalhou como conselheira e tesoureira da BPW Rio. Ela também tem Mestrado em Economia e MBA em Finanças, ambos pelo IBMEC, e é autora de livros voltados ao público feminino sobre investimentos, como “Mulher inteligente valoriza o dinheiro, pensa no futuro e investe” e “Bolsa para mulheres”.
Neste post, você poderá conhecer o cenário que Sandra Blanco enxerga para as finanças pessoais, nos meses que virão. Já nos próximos dois posts do Blog do Veduca, você acompanhará as sugestões da consultora para o pequeno investidor que busca se adaptar às mudanças que virão pelo frente, no curto e no longo prazo.
Antes, porém, veja abaixo o nosso resumo sobre o cenário da reforma e alguns links de notícias a respeito do tema, que você pode consultar se tiver dúvidas a respeito do que o governo está propondo e dos motivos de o debate da reforma estar tão acalorado.
Reforma de Previdência é necessidade, para alguns, e armadilha, para outros

Os argumentos contrários à reforma da Previdência
O tema provoca discussões apaixonadas. Uma parcela considerável da população parece enxergar a reforma como um retrocesso. Esse grupo acredita que a reforma da Previdência, caso aprovada, colocaria um peso excessivo sobre as camadas mais pobres da população, já que elevaria a idade mínima para aposentadoria.
Alguns analistas afirmam que essa mudança na idade mínima é injusta porque os trabalhadores rurais e os mais pobres vivem menos tempo do que os urbanos e os mais ricos e, portanto, seriam desproporcionalmente prejudicados.
Além disso, há pontos específicos da proposta do governo, como a mudança no acesso ao Benefício de Prestação Continuada, concedida a idosos de renda muito baixa, que provocam resistência mesmo entre os aliados do governo.
Outro argumento contra a reforma é o de que há outras maneiras de cobrir o déficit do governo, como cobrar as dívidas das empresas e dos governos municipais e estaduais com o INSS, o Instituto Nacional de Seguridade Social, que administra os recursos da Previdência.
Esses débitos triplicaram, em dez anos, e já representam R$ 476 bilhões, segundo a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional.

Há, ainda, apreensão quanto à reforma no sistema previdenciários dos militares. Proporcionalmente, esse sistema é o que registra maior déficit. As aposentadorias dos militares representam metade do déficit do governo com os benefícios do sistema público, embora a categoria corresponda a 31% do quadro.
O governo apresentou sua proposta de mudanças na aposentadoria dos militares, em março, e ao mesmo tempo propôs um pacote de transformações na remuneração e na estrutura da carreira militar.
Ambos serão discutidos no Congresso de forma separada dos debates sobre a reforma da Previdência para civis.
A reforma do regime dos militares tramitará por meio de mudanças em um conjunto de leis e estatutos, e não por meio de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC), como exige a reforma da Previdência dos funcionários civis públicos e privados.
As críticas às propostas de reforma na aposentadoria dos militares recaem sobre o fato de as mudanças na carreira, apresentadas em conjunto com as mudanças na aposentadoria, aumentarem os gastos do governo com essa categoria.
Na prática, dizem os críticos, é quase como se a proposta relativa à carreira anulasse as economias obtidas com o projeto ligado às aposentadorias. Enquanto o endurecimento do sistema previdenciário dos militares trará economia de R$ 97, 3 bilhões, em uma década, as concessões à categoria significarão aumento de gastos de R$ 86, 85 bilhões, no mesmo período.
Em resumo, é como se o governo economizasse R$ 10,5 bilhões em 10 anos, uma fatia de pouco mais de 1% da meta global do governo, que é economizar R$ 1 trilhão com todas as mudanças propostas.
Os argumentos favoráveis à reforma da Previdência
Para outra parcela da população, assim como para a maior parte dos analistas econômicos, a reforma é a medida mais urgente a ser tomada pelo governo para tentar colocar a economia em rota de crescimento.
Esse grupo afirma que a mudança ajudará a equilibrar as contas públicas, o que contribui de duas maneiras para o aumento do PIB: primeiro, permite que o governo invista em infraestrutura, melhoria dos serviços médicos e educacionais e outras áreas essenciais para o país.
Em segundo lugar, eleva a confiança do setor privado na capacidade do Estado de pagar suas contas e de organizar a economia, já que uma dívida pública sob controle permite ao governo baixar juros, manejar melhor a inflação e garantir um nível adequado de poupança em dólares para honrar os pagamentos externos.
Segundo o governo, a trajetória da dívida pública, sem a reforma, seria tão acentuada, nos próximos anos, que levaria o país a uma situação de incapacidade de pagamento dos benefícios previdenciários. Pelos cálculos do Tesouro Nacional, o rombo da Previdência fechou 2018 na casa dos R$ 290 bilhões.
Disparidade entre setores público e privado é um dos temas centrais
Por fim, outro argumento a favor da reforma da Previdência é a assimetria nos benefícios pagos aos segurados. Funcionários públicos e militares contribuem para um regime diferente (RPPS) daquele para o qual contribuem os trabalhadores da iniciativa privada (RGPS).
Os regimes do setor público e do setor privado possuem regras diferentes. Como explica este post do blog da Nova Concursos, quem ingressou na carreira pública até dezembro de 2003 tem direito à aposentadoria por tempo de serviço prestado (30 anos para a mulher e 35 para o homem) e idade mínima (55 anos para as mulheres e 60 para os homens).
Além disso, a paridade com os ativos era garantida e havia a possibilidade de se retirar com proporcionalidade ao tempo de trabalho. Já para quem entrou depois de 2003, são exigidos dez anos ativos como servidor público e cinco no cargo em que a pessoa pretende se aposentar. A paridade foi derrubada e os profissionais passaram a ter direito apenas ao reajuste do benefício.
Já no regime da iniciativa privada, o teto da aposentadoria é de R$ 5839,45. Porém, cerca de dois terços dos beneficiários recebem só uma salário mínimo por mês.
É importante dizer que o funcionário público contribui com uma alíquota de 11% do salário da ativa ao INSS e não tem direito a FGTS, enquanto o da iniciativa privada paga 8% e pode obter o FGTS quando se aposenta, se não tiver sacado antes o benefício.
Ainda assim, o sistema de aposentadorias do setor público apresenta, proporcionalmente, um déficit bem maior do que o do setor privado. Dos R$ 308 bilhões de déficit da Previdência previstos para 2019, R$ 218 bi corresponderão ao regime geral, o dos funcionários das empresas privadas, que atende mais de 28 milhões de segurados.
Dos R$ 90 bilhões restantes, cerca de R$ 43 bilhões vêm do regime dos servidores públicos civis, que atende a cerca de 1 milhão de pessoas e arrecada em torno de 45% do que gasta. Outros R$ 43 bilhões referem-se à aposentadoria dos militares. A arrecadação com essa categoria é de apenas R$ 3,3 bi, ante um gasto de R$ 46 bi.
É por isso que, para os defensores da reforma de Previdência, mudar o sistema é uma forma de acabar com o que eles chamam de privilégios dos funcionários públicos civis e dos militares.

O cenário das finanças pessoais, segundo Sandra Blanco
A consultora Sandra Blanco deixa claro, no início da conversa, que ela é a favor de que “alguma reforma da Previdência” entre em vigor. Ela acredita que só com uma trasformação no sistema de aposentadorias o país equilibrará suas contas públicas e alcançará um crescimento econômico mais consistente.
Ela também afirma que a maior parte das empresas e dos investidores recebeu positivamente a proposta de mudança apresentada em fevereiro pelo governo federal, ainda que com um certo ceticismo quanto à possibilidade de todas as medidas serem aprovadas.
“Para o mercado, a reforma apresentada pelo governo, com economia de R$ 1 trilhão em 10 anos, é do que o país precisa para que as contas públicas sejam bem administradas”, ela diz. “Porém, os investidores entendem que há margem para manobra”, explica.
Sandra explica que na Órama a expectativa de que a reforma passará tem balizado as análises do cenário macroeconômico e das finanças para os próximos meses. Os analistas da empresa acreditam que o mais provável é que a modificação nas aposentadorias seja aprovada em 2019.
Não é possível prever qual modelo de reforma passará, já que isso depende das negociações no Congresso, mas a percepção da consultora é que o otimismo das companhias e dos investidores crescerá quanto mais próxima de ser aprovada e quanto mais robusta a reforma se mostrar.
A perspectiva da reforma, aliás, tem se somado a uma série de outros fatores macroeconômicos para compor um cenário favorável à elevação do PIB e do valor das empresas listadas na Bolsa de Valores de São Paulo (B3), segundo Sandra
Ela lembra que a inflação, em 2018, ficou na meta prevista pelo governo. O IPCA, Índice de Preços ao Consumidor Amplo, a medida oficial de inflação no Brasil, fechou o ano passado com alta de 3,75%, abaixo do centro da meta, que era de 4,5%, mas dentro da margem aceitável, que ia de 3% a 6%.
Como as empresas ainda têm muito espaço para ampliar a produção antes de chegar ao limite da sua capacidade, os preços devem se manter sob controle também em 2019, segundo a consultora.
Isso favorece a redução dos juros básicos da economia, a taxa Selic, que influencia diversas outras taxas de juros, inclusive as dos investimentos mais comuns e as dos empréstimos para pessoas e organizações.
A Selic encontra-se em 6,5% ao ano, o índice mais baixo desde o início da série histórica, e a perspectiva é de estabilidade nos próximos meses.
Isso é um estímulo ao investimento produtivo, ou seja, as empresas tendem a se abrir mais à possibilidade de ampliação das suas operações.
Já do ponto de vista das finanças pessoais, inflação baixa e juros moderados reduzem a rentabilidade de aplicações mais conservadoras, como a poupança, os títulos do Tesouro atrelados ao IPCA e os fundos de renda fixa.
Dessa forma, empurram o investidor para opções com um grau de risco um pouco mais elevado, mas que oferecem maior rentabilidade. É o caso das ações e dos fundos de ações.
“Depois de uma recessão severa, que obrigou as empresas a fazerem ajustes e a desalavancarem (reduzirem seu endividamento), elas finalmente têm espaço para investimentos. Além disso, estamos em um momento de taxa de juros baixa. Para ganhar mais, o investidor terá que arriscar mais”, explica.
Para Sandra, mais do que nunca é hora de o trabalhador se planejar e ter disciplina para investir com regularidade. Além disso, pensando no longo prazo, será preciso também poupar mais consistentemente para a aposentadoria.
A consultora também compartilhou sugestões sobre como o pequeno investidor deve se posicionar, para aproveitar ao máximo o cenário atual. Esse será o tema do próximo post do Blog do Veduca. Não perca!
Saiba mais sobre a reforma da Previdência
Esta reportagem do site do jornal O Globo resume a proposta de reforma da Previdência apresentada pelo governo federal em fevereiro de 2019. É essa proposta que começa a ser discutida no Congresso. Vale a pena conhecer mais sobre o tema e acompanhar a discussão, que interfere diretamente nos rumos da economia e nas finanças pessoais de dezenas de milhões de brasileiros.
Este vídeo abaixo, da TV Estadão, resume em menos de um minuto as mudanças propostas pelo governo para a aposentadoria dos trabalhadores rurais.
Em qualquer cenário, poupar com regularidade é sempre uma ótima forma de garantir tranquilidade financeira. Neste post do Blog do Veduca, um especialista em finanças dá dicas de como se organizar para guardar um pouco todo mês (ou toda semana).
Créditos das fotos
Foto da chamada (idoso caminha pela rua): Frank Busch no Unsplash – Veja a foto aqui
Militares em Brasília: Andre Gustavo Stumpf Filho – Exército Brasileiro – High Contrast – Veja a foto aqui
Fórum no Recife: Lais Castro no Wikimedia Commons – Veja a foto aqui