- Peri Dias
Parlamentares LGBT+ representam 0,5% do Congresso

Apesar de ter crescido nas eleições de 2018, o número de parlamentares LGBT+ no Congresso brasileiro está muito abaixo do que seria esperado, se a Câmara dos Deputados e o Senado refletissem a proporção de pessoas lésbicas, gays, bissexuais e transgêneras na população do país.
Dos 513 deputados e 81 senadores eleitos em 2018, somente três assumiram publicamente serem LGBT+, segundo sites que cobrem a atuação parlamentar, como o Congresso em Foco, e páginas de notícias sobre o universo LGBT+, como o Observatório G. São eles: Jean Wyllys (PSOL-RJ) e Marcelo Calero (PDT-RJ), na Câmara, e Fabiano Contarato (Rede-ES), no Senado. Juntos, eles representam 0,5% do total de representantes do povo no Poder Legislativo federal.

O anúncio feito por Jean Wyllys, em 24 de janeiro, de que vai renunciar ao cargo de deputado e se mudar para o exterior, por causa das ameaças que vinha recebendo, não alterou a contagem, já que seu substituto no cargo será David Miranda, gay e ativista da causa. No entanto, chamou atenção para a baixa representatividade LGBT+ no Congresso, já que reportagens de alguns dos principais veículos de imprensa do Brasil do mundo destacaram o fato de Wyllys ser, até 2019, o único parlamentar federal a se declarar parte dessa comunidade.
Parlamentares LGBT+ e população
Com a chegada de Calero e Contarato, o número de parlamentares LGBT+ no Congresso cresceu 200%, mas, muito provavelmente, ainda é insignificante em relação ao total de brasileiros que se identificam como parte desse grupo. O “muito provavelmente” usado acima é necessário porque não existem estatísticas oficiais sobre o tamanho dessa população no país, uma vez que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), responsável pelos censos brasileiros e pela Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios, nunca coletou esse dado em seus levantamentos mais importantes.
No entanto, há indícios significativos de que a porcentagem de pessoas LGBT+ no Brasil seria muito maior do que 0,5%. Uma pesquisa divulgada em 2017 pela sexóloga Carmita Abdo, doutora em psiquiatria e coordenadora do Programa de Estudos em Sexualidade do Hospital das Clínicas de São Paulo, ligado à Universidade de São Paulo (USP), apontou que, em sete das principais capitais brasileiras, a proporção de homens que se declaram gays é de 9%, enquanto a de bissexuais fica em 3%. Já entre as mulheres, 6% declaram-se homossexuais e 3% dizem ser bissexuais, o que levaria a uma média nacional de cerca de 10,5% de pessoas LGBT+, sem contar a população trans, que não foi tema dessa pesquisa. Para o levantamento, foram ouvidas 2847 pessoas, dos 18 aos 70 anos, em São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Salvador e Belém, além do Distrito Federal.
O estudo da psiquiatra da USP colheu os dados por amostragem, como uma pesquisa eleitoral, e portanto, não tem a abrangência que teria um censo. Outro ponto a observar é que o levantamento teve um escopo geográfico limitado, já que só ouviu pessoas em grandes metrópoles. Ainda assim, o trabalho foi realizado com metodologia científica, o que costuma levar a um panorama relativamente fiel das áreas pesquisadas.
Em 2013, uma pesquisa do Ibope realizada no Brasil apontou que 16% dos homens e 8% das mulheres que usavam a internet naquele ano assumiam ser gays, lésbicas ou bissexuais. O levantamento foi feito por questionário online e usou o método habitual das pesquisas do instituto, ou seja, o perfil dos participantes refletiu a população brasileira usuária da rede mundial, em aspectos como região, sexo, idade, instrução do chefe da família e classe econômica.
Em outros países, pesquisas recentes com a ambição de mapear o total da população têm indicado uma proporção menor de pessoas LGBT+ do que as duas pesquisas do Brasil. Nos Estados Unidos, um amplo levantamento do instituto Gallup apontou que 4,5% dos americanos se identificam como parte dese grupo. No Reino Unido, dados do governo apontam que cerca de 2% da população dizem ser LGBT+.
Nos dois países, assim como no Brasil, o número de pessoas que se assumem lésbica, gays, bissexuais ou transgêneros cresceu nos últimos anos. Segundo pesquisadores, isso provavelmente tem relação com o fato de as pessoas se sentirem cada vez mais seguras para assumir que são LGBT+. A diferença entre gerações também é gritante: indivíduos entre 18 e 30 anos são muito mais propensos a dizerem que são parte desse grupo do que os que possuem mais de 50 anos, o que os especialistas interpretam como efeito de uma sensação maior de liberdade, entre os mais jovens, para afirmarem que não são heterossexuais ou cisgêneros (pessoas que se identificam com o gênero atribuído a elas no nascimento).
Também há diferenças nos resultados de acordo com o método de pesquisa.
Levantamentos feitos via internet tendem a chegar a uma maior proporção de pessoas LGBT+ do que os que são feitos presencialmente, mesmo quando usam os mesmos filtros de idade, renda, região e outros. Para os autores das pesquisas, isso acontece porque as pessoas se sentem mais protegidas pelo anonimato, quando respondem pelo computador.
De qualquer forma, mesmo considerando-se as estatísticas mais conservadoras, a proporção de 0,5% de parlamentares LGBT+ na esfera federal, no Brasil, parece estar muito abaixo da porcentagem real de pessoas pertencentes a esse grupo.
Em 2016, o IBGE disse planejar a inclusão dos dados sobre a população LGBT+ em suas pesquisas. Enquanto as informações oficiais não forem divulgadas, o máximo que se pode fazer para avaliar a representatividade numérica desse grupo no Congresso é um exercício sem validade científica, mas baseado nas pesquisas disponíveis.
Supondo que a proporção de indivíduos LGBT+ no Brasil fosse semelhante à das estatísticas oficiais do Reino Unido, por exemplo, o número de parlamentares LGBT+ no Congresso teria que ser de 12, para refletir a realidade das ruas. Caso fosse semelhante à da pesquisa Gallup nos Estados Unidos, seria preciso que 26 deputados e senadores se elegessem.
No caso das duas pesquisas brasileiras, a comparação torna-se mais complicada, porque os levantamentos não tiveram o objetivo de captar a realidade de todo o país, mas de universos mais restritos – o de algumas grandes cidades, no caso da pesquisa da psiquiatra Abdo, e o de usuários da internet em 2013, no caso do Ibope. Caso esses estudos apontem para cenários próximos ao que um censo revelaria, por exemplo, a representatividade fiel no Congresso corresponderia a 62 parlamentares LGBT+, no caso do estudo de Abdo, e 71 para o do Ibope. Só lembrando, hoje são três.
Parlamentares LGBT+ não são os únicos que defendem a causa
A representatividade das minorias no Congresso é um fator importante para o avanço das pautas de interesse desses grupos, segundo a maioria dos pesquisadores em Ciências Políticas e Sociais (o blog do Veduca vai tratar desse tema em um próximo post). Porém, nem todos os deputados e senadores que defendem a causa LGBT+ identificam-se como parte desse grupo.
Nas eleições de 2018, a Aliança Nacional LGBTI+, um dos principais grupos ativistas sobre o tema no Brasil, lançou uma plataforma e um Termo de Compromisso, com o objetivo de obter dos candidatos a cargos dos poderes executivo e legislativo a promessa de que trabalhariam pelos direitos LGBT+, caso eleitos. Entre os parlamentares que se elegeram, a carta obteve a adesão de uma senadora (Mara Gabrilli, do PSDB-SP), 12 deputados federais e 17 deputados estaduais ou distritais. Desses 30 representantes, 26 declaram-se “pessoas aliadas”, ou seja, não se identificam como lésbicas, gays, bissexuais ou trasgêneros.
Parlamentares LGBT+ na esfera estadual

Discutir a representatividade LGBT+ na esfera estadual é ainda mais difícil, por causa da escassez de dados sobre essa população em cada unidade da federação. Porém, algumas mudanças na composição das casas legislativas, em 2019, foram comemoradas por grupos ativistas da causa, como mostrou uma reportagem do site Vice, assinada por Bruno Costa. Foi o caso do estado mais populoso do país. A Assembleia Legislativa de São Paulo contará, pela primeira vez, com duas deputadas transgêneros e negras, Erica Malunguinho e Erika Hilton, ambas do PSOL. Também foram eleitas Isa Penna (PSOL) , que é bissexual e feminista, e Leci Brandão (PC do B), que tem na questão LGBT+ uma de suas principais bandeiras. Outra aliada da causa é a deputada Mônica Seixas (PSOL), heterossexual, que assinou a carta da Aliança Nacional LGBTI+. A Assembleia paulista tem 94 deputados.
Pernambuco também elegeu a primeira deputada trans do estado, Robeyoncé Lima (PSOL), a primeira advogada transgênero das regiões Norte e Nordeste a usar seu nome social na Ordem dos Advogados do Brasil. Já no Distrito Federal, o assistente social Fábio Félix (PSOL) tornou-se o primeiro deputado distrital assumidamente gay. No Rio de Janeiro, a deputada eleita Enfermeira Rejane (PC do B) também se declarou LGBTI+.
Quer saber mais sobre parlamentares LGBT+?
O movimento #MeRepresenta, formado por coletivos e organizações LGBT+, entrevistou participantes da Parada LGBT+ de São Paulo sobre a representatividade política desse grupo no país. Mais de 90% dos participantes disseram que não se sentem representados pelos políticos brasileiros.
Veja mais no vídeo abaixo, que também discute por que é importante para essa comunidade que mais parlamentares LGBT+ sejam eleitos.
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