- Peri Dias
LGBT no mercado de trabalho: o que mostram as pesquisas

O Brasil ainda tem muito a avançar no respeito à comunidade LGBT no mercado de trabalho, mas iniciativas para valorizar a diversidade de orientação sexual e de gênero começam a fazer a diferença em algumas empresas. É isso que mostram algumas das pesquisas mais recentes sobre o tema, realizadas por consultorias ou organizações não-governamentais que atuam no mundo todo.
Antes de discutir esses dados sobre a comunidade LGBT no mercado de trabalho, é importante lembrar o que significa a sigla. LGBT é a denominação mais utilizada para designar o conjunto das pessoas que se identificam como lésbicas (L), gays (G), bissexuais (B) e travestis, transexuais e transgêneros (T).
Como há um espectro amplo de orientações sexuais e de gênero, as siglas para se referir a essa comunidade também variam de acordo com o aspecto que se quer destacar. Siglas como LGBT+ (o + representa toda a gama de identidades que vão além das quatro mencionadas), LGBTQ (o Q representa a identidade queer) e LGBTTT (para valorizar a diversidade que existe entre travestis, transexuais e transgêneros) também são bastante utilizadas, mas de modo geral, todas se referem à variedade de possibilidades de orientação sexual e de gênero que o ser humano expressa.
Uma boa forma de conhecer melhor o tema é assistir ao curso online grátis sobre LGBT+ disponível no Veduca. Os vídeos apresentam os conceitos mais importantes e atuais dessa área de estudo e trazem depoimentos de pessoas que fazem parte dessa comunidade sobre suas experiências de vida.
Incluir a comunidade LGBT no mercado de trabalho importa?
De volta ao tema da inclusão LGBT no mercado de trabalho, um dos pontos de maior interesse dos pesquisadores é descobrir se essa questão tem impacto relevante no desempenho das empresas. Para os profissionais que fazem parte da comunidade LGBT, é evidente que o assunto importa, já que um ambiente de respeito e igualdade de oportunidades amplia sua qualidade de vida e suas perspectivas de crescimento na carreira.
Do ponto de vista das companhias, valorizar a diversidade faz sentido porque torna concretos os valores, a visão e a missão que muitas deles carregam. O que as pesquisas têm mostrado, porém, é que as companhias que adotam políticas de inclusão ganham também em eficiência.
Um dos levantamentos mais conhecidos é o da consultoria global McKinsey, divulgado em janeiro de 2018, com dados de 2017. Mais de mil empresas, em 12 países, responderam a questões tanto sobre lucratividade quanto políticas de inclusão nos aspectos étnicos e de gênero. As companhias foram divididas em quatro grupos, de acordo com as suas ações de inclusão, e uma das principais conclusões foi que as empresas que se encontravam no grupo mais avançado em valorização da diversidade eram 21% mais propensas a ter lucratividade acima da média, quando comparadas com as empresas do grupo menos avançado em diversidade.
A pesquisa indica que a correlação entre inclusão e bom desempenho nos negócios aumentou, em relação à versão anterior do mesmo levantamento, divulgado em 2014.
Naquela primeira rodada do estudo, as empresas mais avançadas tinham propensão 15% maior a ter lucratividade acima da média. A McKinsey destaca, particularmente, a importância da representatividade feminina no topo da hierarquia das empresas.
“As equipes executivas das empresas de performance superior têm mais mulheres em cargos de liderança do que em outras funções”, afirma a consultoria. A empresa também explica que, embora não tenha pesquisado as causas para essa correlação entre diversidade e performance, as hipóteses mais prováveis são de que empresas mais diversas e inclusivas conseguem “atrair os melhores talentos, aumentam seu foco no cliente, a satisfação dos funcionários e melhoram a tomada de decisões”.
Mas existe alguma pesquisa específica sobre a comunidade LGBT no mercado de trabalho?
Sim, existe. Uma das mais recentes (em inglês) foi divulgada em agosto de 2018, pela Câmara de Comércio LGBT de Winsconsin, nos Estados Unidos. A organização contou com o apoio de pesquisadores doutores da Escola de Negócios da Universidade de Marquette, para criar a metodologia da pesquisa e analisar as respostas de 88 empresas e organizações não-governamentais sobre a presença de pessoas abertamente LGBTs em seus postos de comando. A conclusão foi que as empresas que têm uma ou mais pessoas dessa comunidade nos cargos mais altos de chefia (68% da amostra) apresentam melhor performance nos negócios do que as que não têm.
“Esse estudo confirma o que temos dito há anos: contar com pessoas LGBTs em posições de liderança, seja como CEO, dono do negócio, parte da liderança sênior ou no conselho de diretores, contribui para a performance nos negócios” afirma Jason Rae, presidente e CEO da Câmara de Comércio LGBT de Winsconsin.
De acordo com o levantamento, os indicadores de desempenho em que se registrou a maior diferença entre as empresas mais inclusivas e as demais foram responsabilidade social e ambiental, práticas de RH e qualidade da mão-de-obra.

Como está o Brasil, em termos de inclusão LGBT?
O Brasil avançou em alguns pontos, mas ainda fica bem longe dos países que lideram o mundo, nesse tema. Uma pesquisa ampla e global (em inglês) sobre o a comunidade LGBT no mercado de trabalho foi divulgada, em 2016, pelo Center for Talent Innovation, uma organização de pesquisa e compartilhamento de experiências que tem parcerias com o Fórum Econômico Mundial e a escola de negócios Insead.
A conclusão, para o Brasil, foi um misto de aprovação e reprovação. Primeiro, os pesquisadores dividiram em grupos os dez países onde a pesquisa foi realizada, de acordo com o grau de proteção que as leis locais oferecem contra a discriminação. No pelotão chamado de “hostil”, dos países onde a homossexualidade é criminalizada, ficaram Rússia, Índia e Cingapura. O grupo intermediário, chamado de “pouco amigável”, por não ter leis que protejam contra a discriminação, foi composto por China, Hong Kong e Turquia. O Brasil posicionou-se no terceiro conjunto, o “amigável”, por possuir leis que preveem penas contra a discriminação de LGBTs. Nesse grupo, também entraram Estados Unidos, Reino Unido e África do Sul.
Na segunda etapa da pesquisa, porém, o Brasil derrapou. O levantamento compilou respostas de mais de 12 mil profissionais de empresas multinacionais, dos quais mais de 80% declararam-se não-LGBTs, sobre sua experiência no ambiente de trabalho. Entre os funcionários brasileiros que se identificaram como LGBTs, quase dois em cada três (61%) afirmaram que não assumem sua orientação sexual ou de gênero no trabalho. Foi a porcentagem mais alta de pessoas “no armário”, entre os países do grupo “amigável” – o índice foi de 57% na África do Sul, 53% no Reino Unido e 46% nos Estados Unidos.
Mesmo entre os profissionais que “saíram do armário”, a inclusão da comunidade LGBT no mercado de trabalho não parece nada fácil. No Brasil, 49% dessas pessoas disseram que, no ambiente corporativo, tentam amenizar os sinais de que são LGBT, outra vez o índice mais alto no pelotão dos países com leis inclusivas – na África do Sul, a porcentagem foi de 46%, e alcançou 30% nos Estados Unidos e 28% no Reino Unido.
A economista Sylvia Ann Hewlett, fundadora e CEO do Center for Talent Innovation (CTI), responsável pela pesquisa, ressalta as vantagens das políticas de diversidade e inclusão nas empresas.
“Profissionais LGBT que trabalham em companhias que os fazem se sentir seguros de discriminação são mais propensos a se engajar e a trazer o seu ‘eu’ verdadeiro para o trabalho”, ela diz. “Pesquisas anteriores do CTI mostram que quando os empregadores criam um ambiente inclusivo, eles adquirem um diferencial em sua habilidade de recrutar os melhores talentos, estimular o potencial de inovação e conquistar a lealdade dos novos segmentos de mercado”, complementa Hewlett.
A orientação sexual e de gênero das pessoas LGBT chega a interferir na escolha da carreira ou na permanência em uma empresa. Foi o que mostrou um estudo chamado “Demitindo Preconceitos – por que a empresas precisam sair do armário”, divulgado em 2015 pela empresa paulista Santo Caos, que se define como a primeira consultoria de engajamento do Brasil. Neste vídeo, eles mostram depoimentos que reforçam essas conclusões.
O que as empresas brasileiras têm feito para aproveitar o talento da comunidade LGBT no mercado de trabalho?
A companhias comprometidas com políticas efetivas de diversidade e inclusão, no Brasil, ainda são minoria, na opinião de quem estuda o tema. Isso não significa que as empresas necessariamente discriminem ou permitam a discriminação, até porque qualquer organização precisa seguir a legislação brasileira. Porém, elas não fazem tudo o que podem para garantir um ambiente em que todos se sintam confortáveis sendo quem são.
O levantamento da consultoria Santo Caos também joga luz sobre os efeitos dessa baixa proatividade das empresas. Ao entrevistar 230 pessoas, os pesquisadores descobriram que 40% dos profissionais LGBT participantes do estudo já sofreram discriminação por orientação sexual no trabalho. As principais situações descritas foram piadas sem consentimento feitas por superiores ou colegas, isolamento por parte dos outros funcionários, fofocas, assédio moral e exposição por parte dos colegas, o que em alguns casos levou os funcionários vítimas do ataque a pedir demissão.
Na contramão desse retrato triste, há várias iniciativas em curso, dentro das empresas, para que a experiência LGBT no mercado de trabalho seja mais positiva. O Fórum de Empresas e Direitos LGBT publicou, em 2017, um levantamento que indica a situação de 36 companhias, no que se refere ao seu compromisso com a inclusão de pessoas dessa comunidade. As empresas já haviam a carta de adesão ao fórum e a uma cartilha com 10 compromissos.
De acordo com o estudo, 100% das organizações participantes já haviam tomado alguma medida prática para promover um ambiente “respeitoso, seguro e saudável”, o que inclui ações como definir o enfrentamento à homolesbotransfobia em seu Código de Conduta e criar canais de reclamação contra a discriminação, com profissionais capacitados no tema dos direitos LGBT. Mais de 93% das companhias também já haviam avançado no apoio à criação de grupos de afinidade LGBT.
Companhias brasileiras precisam seguir ampliando suas políticas de diversidade
A opinião é de Jorgete Lemos, consultora em Recursos Humanos e diretora da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH). Veja abaixo uma entrevista em que ela fala sobre o tema, na TV Brasil.
Por fim, neste vídeo da plataforma TED, a americana Morgana Bailey, que se define como ativista de Recursos Humanos, compartilha sua própria experiência para revelar os impactos de alguém ter que esconder sua própria identidade.
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